Uma sociedade justa?

Uma sociedade justa?

Uma sociedade justa é uma sociedade que se baseia no princípio da igualdade de acesso à educação, saúde, cultura e participação na vida política, sendo obrigação do Estado intervir através das suas competências de modo a que essa justiça seja real e não apenas conceptual;

Uma sociedade justa é uma sociedade em que o governo assume uma posição institucional, com poderes de decisão e exclusivamente preocupada com o bem-estar social da população que constitui o seu espaço de governação, usando critérios de eficiência, liberdade mas principalmente de equidade;


Uma sociedade justa é uma sociedade com princípios assentes no princípio de iguais condições básicas de vida, onde cada pessoa deve ter as mais extensas condições, compatíveis com semelhantes condições dos outros, não devendo ser aceite um afastamento ao princípio de igualdade justificado com base em maiores vantagens económicas;

Uma sociedade justa é uma sociedade cujo papel do Estado é de garantir que todos os indivíduos na sociedade tenham acesso aos bens primários sociais, sobretudo, aqueles que se encontrem em piores condições de as obter.

Este é o meu ideal de sociedade, com princípios de justiça, com os princípios impulsionadores de um Estado justo, de um Estado social, com os mesmos princípios orientadores da Constituição da República. Princípios que tendem a ser esquecidos em períodos de crise económica, servindo esta como «bode expiatório» para as más medidas de gestão que sistematicamente têm sido tomadas. É certo que gerir recursos em tempo de «vacas gordas» é bem mais fácil que gerir recursos em tempos de crise, isso é uma verdade inegável. Contudo, gerir um dos pilares de uma sociedade democrática e social, como é o caso da Saúde, através do rácio de custo per capita desse mesmo serviço, é no mínimo insultuoso para com a população local que os elegeu. Defender-se a eliminação das urgências permanentes do Centro de Saúde das Lajes do Pico para introdução de duas viaturas SIV, como meio de redução de “custos”, é de quem é alheio ao real problema dos Açores e mais propriamente de uma ilha como a do Pico. E mesmo quando apresentados os resultados “extremamente positivos” de estudos anteriormente obtidos nas ilhas de São Miguel, Terceira e Faial, conforme foi defendido pelo Médico impulsionador deste projeto, não se pode nunca, deixar de ter em conta as diferentes realidades que existem de ilha para ilha. Não querendo eu desrespeitar os seus decisores, posso afirmar que estas medidas de “gestão” a implementar servem apenas para o início da total destruição de um direito inegável de todos os cidadãos, a Saúde!

Hoje, o concelho das Lajes do Pico possui aproximadamente menos 6,5% da população face à população de à 10 anos atrás, ou seja, todos os anos o concelho das Lajes do Pico fica em média com menos 33 habitantes do que no ano anterior, possui também uma média aproximada de 2 idosos por cada jovem do concelho o que significa que a tendência para a diminuição da sua população seja por si uma realidade cada vez mais certa. E, seguindo o conceito da gestão do “custo” per capita para redução das despesas da saúde adotado pela Secretaria Regional da Saúde como justificação para o encerramento do serviço permanente de urgências das Lajes do Pico, leva-me a crer que nos próximos dez ou vinte anos iremos ouvir falar novamente neste assunto, mas, desta vez para o encerramento total do Centro de Saúde em si!

O problema não é tão superficial como o querem fazer parecer, este problema tem de ser visto de uma forma mais profunda do que apenas na gestão orçamental de redução de “despesas”, pois um aumento da população sem essas variações de “custos” diminuiria o rácio que hoje se classifica como insuportável e já não se colocaria esta discussão!
    
Num Estado Social, em que contínuo firmemente a acreditar, a Saúde não pode ser vista exclusivamente como um «custo orçamental», não pode ser gerida através do rácio de custo/pessoa e não pode, nem deve ser gerida unicamente na redução de custos per capita, ainda para mais, quando essas medidas estão diretamente associadas ao risco da diminuição da qualidade do serviço prestado. E, quando cada vez mais se combate as medidas do atual governo sobre as questões da regionalização dos serviços públicos, onde já se verificou que a qualidade dos serviços prestados às populações mais isoladas diminuiu, não deveria de modo algum, ser sequer apresentada a centralização de um centro de urgências num local da ilha do Pico que foi escolhido sem terem sido tidas em conta as realidades geodemográficas e epidemiológicas da população, ainda mais, quando essa decisão sobre o serviço promove uma maior desigualdade ao seu acesso e à sua cobertura por parte da população das Lajes do Pico e da população dos restantes concelhos da ilha!

As medidas que o Sr. Secretário da Saúde em representação do Governo Regional deveria ter apresentado, deveriam ser medidas de melhoria real dos serviços já existentes, que aumentassem a “qualidade de vida” da população, que fossem ao encontro da atração de jovens para o concelho, medidas que incentivassem os jovens a regressar à ilha do Pico após terminarem as suas licenciaturas ou estudos, medidas que incentivassem os jovens a permanecerem na sua terra, medidas que gizassem a médio prazo, o aumento ao incentivo para que jovens de outras regiões tomassem a decisão de vir para a ilha do Pico, combatendo este problema de desertificação rural em que a Europa, Portugal e a maioria das regiões portuguesas se encontram. Contudo, as medidas aplicadas e que se pretendem aplicar, têm sido cada vez mais contrárias à real necessidade da ilha do Pico, tornando-se medidas que tendem a criar um efeito de afastamento dos jovens, medidas que conduzirão a Vila das Lajes, num futuro não muito distante, a tornar-se numa vila fantasma, a tornar-se apenas numa lembrança que será apagada da memória dos portugueses como tantas outras vilas e aldeias que foram sendo esquecidas por todo este nosso Portugal.

Nota:

Independentemente dos pontos de vista que possam ser exercidos, é importante salientar a educada e respeitosa pessoa que demonstrou ser o Sr. Secretário Regional da Saúde ao deslocar-se a esta ilha para debater um assunto tão delicado como o fecho do serviço permanente de urgências, mostrando-se sempre disponível para ouvir e responder (mesmo que as respostas não fossem do agrado da população) às questões colocadas, terminando a sessão de esclarecimentos após as 02:30 da manhã e apenas quando mais ninguém quis intervir!

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